Open Banking e os desafios tecnológicos no Brasil
“Toda empresa é uma empresa de tecnologia”. Esta frase foi dita por Peter Sondergaard no Gartner Symposium de 2013. Sete anos depois, podemos afirmar, diante do impacto que a transformação digital tem gerado em todas as indústrias e segmentos de mercado, que ele estava certo.
No relatório Serviços Financeiros 2020 e Além da PWC, ao dizer que o digital se tornou o convencional, uma constatação chama a atenção: “duas décadas atrás, muitas grandes instituições financeiras construíram unidades de ‘e-business’ para atrair uma onda de interesse dos e-commerces. Eventualmente, o ‘e’ inicial foi embora e se tornou o novo normal”. Afirmações como esta demonstram como o uso de tecnologia tem se tornado central na estratégia de negócios das empresas que atuam no mercado financeiro.
O Brasil, por sua vez, tem se destacado especialmente no cenário das fintechs. Dentre as nove startups unicórnios brasileiras listadas no “The Crunchbase Unicorn Leaderboard” do TechCrunch, duas são fintechs, sendo que uma delas está entre as 30 mais valiosas com um valuation de US$ 10 bi.
Em relação ao Open Banking, o país tem sinalizado bons avanços para regulamentar e iniciar a implementação no segundo semestre de 2020 com o modelo “Sistema Financeiro Aberto”, que foi classificado como brilhante por Gavin Littlejohn, que ajudou a implementar o sistema no Reino Unido, um dos primeiros a serem regulamentados e serviu como base para o desenvolvimento de muitos outros, incluindo o brasileiro.
Mas regulamentar e estabelecer padrões não fará com que as empresas estejam prontas para expor os dados de seus clientes. Os desafios vão além da adoção de novas tecnologias e precisam ser levados em conta para que a operação das instituições financeiras sejam capazes de se adequar a esta nova realidade. Listamos aqui três desafios tecnológicos que impactarão o Open Banking no contexto brasileiro.
1. Exposição e governança de APIs
Open Banking e uso de APIs são, praticamente, indissociáveis. Todo o conceito tem como base tecnológica a exposição e consumo de serviços utilizando APIs (Application Programing Interface) e, apesar de seu uso não ser novidade, a utilização delas neste novo modelo traz desafios, como gerenciar TPPs (Third-Party Providers) com identidade digital, por exemplo.
O uso de APIs cria uma nova interface digital ao disponibilizar informações para terceiros em um ambiente público, onde as instituições têm pouco controle. Além do desafio de regulamentação do modelo, preocupações com segurança peculiares ao mercado brasileiro e à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) influenciarão no tratamento dos dados disponibilizados.
Neste sentido, é essencial ter mecanismos de controle que sustentem estas preocupações e garantam a padronização no acesso, de forma fácil, segura e com governança. O desenvolvimento deste ecossistema deve contemplar o uso de tecnologias como API Gateways e sistemas de API Management, que habilitam uma estratégia mais segura de implementação do Open Banking.
2. Integração dos novos canais digitais, sistemas legados e a plataforma Core Banking
A integração entre os sistemas legados que compõem a plataforma Core Banking e os canais digitais convencionais já é passado para a maioria das instituições. No entanto, a integração deste novo canal digital utilizando APIs públicas representa um novo desafio principalmente para as instituições que não são nativas digitais.
A utilização de dados de sistemas legados e a integração dos sistemas Core com as novas entidades do sistema exigirá um roadmap evolutivo, que envolve desde a avaliação de integrações sistêmicas, até a adoção de novas tecnologias.
3. Otimização e automação de processos para ser mais eficiente
A utilização de APIs públicas para o consumo de dados dá abertura para a entrada de novos players, produtos e serviços no mercado. Isso significa que a concorrência irá aumentar e que eficiência e qualidade de serviço serão fatores importantes para o sucesso no cenário de Open Banking. Tecnologias de automação, como RPA, Inteligência Artificial no atendimento ao cliente e técnicas e ferramentas de Process Mining para mapear, monitorar e otimizar processos podem trazer vantagem competitiva neste cenário, ao reduzirem custos e proporcionarem uma melhor experiência ao usuário.
Esta é, provavelmente, a maior revolução vista pelo mercado financeiro na história e trará vantagens consideráveis para toda a comunidade, gerando uma grande oportunidade de transformação e captura de novas fontes de receitas para as instituições que atenderem de forma eficiente as demandas tecnológicas deste modelo.
*Gilson Missawa é head de Ofertas e Desenvolvimento de Produtos na Icaro Tech